quinta-feira, 12 de setembro de 2019

Gestão de Adoção de Mudanças: sua importância em um mercado em constante evolução (Parte II)

No artigo anterior, apresentou-se sucintamente a Gestão de Adoção de Mudanças, seus motivadores e seu valor para o sucesso de projetos de transformação corporativa, alguns exemplos em que a falta de observância de seus preceitos pode acarretar um retorno sobre o investimento aquém do desejado, e uma breve introdução ao framework ADKAR®.
Neste artigo, minha intenção é estender a discussão à importância de se abordar projetos de transformação corporativa com uma metodologia adaptável a diferentes culturas, comparar as exigências de um plano de adoção de mudanças para os colaboradores individuais e para a empresa como um todo, como cada fase do ADKAR® deve ser tratada para assegurar uma adesão suave e eficaz, e o papel da média gerência no sucesso da adoção das mudanças.
NOTA: a Seção 3 é basicamente uma compilação de conhecimento sobre o modelo ADKAR®, e pode ser direta e mais completamente visitada nas Referências [1], [2] e [3]; se o leitor já estiver familiarizado com o framework, ou se quiser aproveitar apenas as discussões mais práticas, pode saltar esta seção sem detrimento da compreensão do texto.

1. Somos todos iguais – até certo ponto

Seria de certo modo ingênuo assumir que existe uma abordagem única, uma "bala de prata" que sirva para toda e qualquer situação de toda e qualquer empresa. Companhias grandes e estabelecidas possuem um misto de convicção nas abordagens tradicionais de negócios que a levaram ao sucesso atual e uma "massa" operacional que, ao mesmo tempo em que proporciona confiabilidade e solidez, inclusive em sua percepção no mercado, confere grande inércia a movimentos de transformação. No outro lado do espectro encontram-se empresas com o modelo startup, cujo valor está justamente em sua adaptabilidade e capacidade de reinvenção constante, o que em contrapartida pode levar a uma noção de volatilidade e inconstância. Entre esses extremos está uma extensa gama de firmas que lidam constantemente com o equilíbrio entre a necessidade de mudanças e o desejo de estabilidade.
Isto pode dar a entender que, por "cada caso ser um caso" e por uma impressão de intangibilidade imediata, o tratamento da prática de Gestão de Mudanças não é passível de uma metodologia e que, portanto, deva-se tomar uma (ou uma combinação) de quatro decisões:
  • Assume-se que os fatores humanos da mudança alcançarão automaticamente 100% no momento em que ela é introduzida, ou na data de seu lançamento ("go-live")
  • Adia-se as medidas de Gestão de Mudanças para tarde dentro do cronograma do projeto, preferindo-se a alocação de tempo e recursos à construção de artefatos tangíveis; muitas vezes projetos assim conduzidos prescindem de um gestor profissional e específico para a disciplina;
  • Promove-se apenas iniciativas de treinamento, capacitação de usuários/envolvidos-chave (para disseminação posterior de conhecimento) e alguma comunicação interna, e espera-se que a adoção ocorra com o tempo;
  • Prepara-se uma grande estrutura de serviço ao cliente interno/Help Desk para atender às dúvidas que vão surgindo após a implantação, assumindo um aprendizado "on-the-fly".
Não é dizer que as iniciativas de treinamento, comunicação e suporte pós-implantação não sejam de vital importância para o sucesso da adoção da mudança. O que não se deve entender é que estas sejam as únicas atitudes que possam ou devam ser tomadas. Pode-se muito bem atender a estes pontos e, se, desde o começo, não se forneça às partes afetadas uma razão, uma consciência e um empoderamento específicos para se optar pela nova forma de conduzir o negócio e suas atividades profissionais, elas poderão tomar ações que vão desde a demora na adesão ao novo modelo e o contorno puro e simples dos novos processos à propaganda negativa da empresa em seus meios de convivência e, em último caso, abandono da companhia.
Isso posto, é justamente para que todos estes elementos sejam contemplados, priorizados e cumpridos que se necessita uma metodologia, e esta metodologia deve ser flexível o bastante para não deixar escapar pontos essenciais para a boa condução da mudança ao mesmo tempo em que consiga se adaptar às demandas específicas de cada organização.

2. O indivíduo e a organização no contexto da Gestão de Mudanças

Nesta seção vamos tratar mais detalhadamente de dois dos princípios elaborados por Hiatt e Creasey em [1] e citados na Parte I:
  • Mudança organizacional requer mudança individual
  • Resultados organizacionais são o efeito coletivo de mudanças individuais
A relação é simples: quanto mais perto da totalidade de colaboradores engajados no novo modelo a empresa estiver, mais perto se estará do atingimento da totalidade dos benefícios esperados. Da mesma forma, o quão mais rápida esta adoção se dá, mais cedo estes resultados se realizam. Para não se estender desnecessariamente sobre este conceito simples, assume-se que o leitor entenda que a situação contrária é igualmente válida.
Retomando o caso de estudo do Parte I, notamos vários pontos de atenção em relação à não obtenção total dos benefícios planejados na implementação do ERP/CRM:
  • A razão para a mudança não é (em realidade, nunca é) o sistema em si: A razão é a melhoria dos processos, como o citado Lead-to-Cash, para uma melhor atendimento ao cliente final, planejamento de produção, estoques e marketing.
  • A falha em se considerar o aspecto humano da mudança leva a um resultado negativo para o cliente: Mais do que a frustração de nossa persona José, o executivo de vendas, mais do que a resistência ou demora na adesão plena ao novo processo, quem é afetado pela adoção problemática é o cliente, que, no geral, sofrerá com ordens de compra atrasadas, inconsistência em precificações e campanhas mal direcionadas.
  • A implementação de mudanças organizacionais e de sistemas, por si e em si mesma, não produz resultados diretos para o negócio: apenas através de mudanças individuais e das novas capacidades dos colaboradores pode-se realizar um novo estado futuro e a consecução dos benefícios de negócio
  • Os efeitos gerais para a empresa são o resultado coletivo das ações de vários colaboradores: mesmo se Amanda, a gerente de marketing, tiver abraçado completamente a adoção do novo CRM no apoio à construção de campanhas focadas e eficazes, se os dados de vendas e comportamento de cliente advindos do ciclo Lead-to-Cash estiverem deficientes por baixa adesão da equipe de vendas, o benefício esperado especificamente para o marketing é diminuído. Cada pessoa na cadeia do processo deve se engajar na mudança para que o benefício planejado completo seja atingido.
Ainda de acordo com Hiatt e Creasey em [1]:
A realidade das organizações hoje é que os colaboradores têm [uma grande gama de] escolhas e restrições de capacidades. A saturação de mudanças está em um pico histórico. A resistência à mudança é a norma e não a exceção, especialmente quando a mudança é imposta por outros. A falha ao conduzir o lado humano da mudança resulta em baixa utilização, baixa velocidade de adoção e proficiência pobre; colocado de forma simples, resulta em menor benefício.

3. Um passo depois do outro

Vamos então aprofundar um pouco nossa visão em cada fase do modelo ADKAR®. Nas descrições abaixo, note que, por vezes, um termo pode aparecer com inicial em maiúscula ou minúscula. Os termos capitalizados referem-se aos conceitos como definidos pelo modelo ADKAR®, enquanto que os demais estão em suas acepções originais.

Consciência

Criar Consciência, segundo a definição do modelo ADKAR®, significa compartilhar a natureza da mudança e responder por que essa mudança se faz necessária. Significa explicar claramente os fatores ou oportunidades de negócios que resultaram na necessidade de mudança, assim como por que ela é necessária neste momento e os riscos de não se mudar. Dessa forma, Consciência é definida como "conscientização da necessidade de mudança", não simplesmente "conscientização de que uma mudança está acontecendo".

Obstáculos à conscientização

Algumas das principais barreiras à Consciência são:
  • Conforto com o status quo
  • Credibilidade da fonte ou remetente da mensagem
  • Negação de que as razões da mudança são reais
  • Discussão improdutiva sobre os motivos da mudança
  • Rumores ou desinformação
A falta de Consciência é uma das principais razões para a resistência dos colaboradores. Estudos da Prosci [5] reportam que, em situações de mudança, os funcionários não se opunham à solução ou à nova maneira de trabalhar, mas resistiram à mudança porque não foi providenciado um argumento claro e convincente sobre por que a mudança era necessária em primeiro lugar.
Quando uma organização está com problemas e isto encontra-se visível para os funcionários, é fácil criar Consciência da necessidade de mudança. No entanto, conscientizar quando uma organização está obtendo sucesso é frequentemente uma proposta mais difícil. Neste caso, profissionais de Gestão de Mudanças precisam criar um caso convincente para que os motivos sejam manifestamente evidentes.

Desejo

O próximo passo na mudança bem-sucedida é tomar uma decisão pessoal para apoiar e participar da mudança. Contra-intuitivamente, alguns dos maiores desafios para a prática da Gestão de Mudanças estão na criação do Desejo por mudança.

Fazendo a transição entre Consciência e Desejo

Saber das razões para a mudança e seu impacto para o negócio não acarreta diretamente o desejo pela transformação; não traduzir essas razões em fatores motivacionais pessoais e organizacionais é uma armadilha que Gestores de Mudança enfrentam, e isso pode ser muito desanimador e exasperante para os colaboradores.
Para uma transição bem-sucedida, é vital a participação de toda a estrutura de gestão, dos altos executivos no patrocínio estratégico à média gerência e supervisores na orientação dos colaboradores (mais sobre este ponto na Seção 4). Ainda assim, embora certamente haja maneiras de tentar influenciar a decisão de uma pessoa a adotar uma mudança, no final das contas são os indivíduos que devem tomar essa decisão por si mesmos. Como na Consciência, o Desejo só é alcançado quando o indivíduo diz: "Eu farei parte dessa mudança".
Alguns motivadores na construção do Desejo são:
  • Probabilidade de ganho ou conquista (incentivo)
  • Temor pela consequência (risco ou penalidade)
  • Aspiração em fazer parte de algo
  • Disposição para seguir um líder em que se confia
  • Noção de que a alternativa é pior

Obstáculos ao Desejo

Algumas das principais barreiras ao Desejo são:
  • Conforto ou segurança com a forma como as coisas estão atualmente
  • Temor do desconhecido
  • Mudança não alinhada com os interesses ou valores pessoais do indivíduo
  • Sem resposta para a pergunta "O que há nisso para mim?" (WIIFM)
  • Histórico negativo com mudanças no nível pessoal
  • Histórico negativo com mudanças na organização
  • Situação pessoal do indivíduo (financeira, carreira, família, saúde)

Conhecimento

As empresas têm uma longa história em oferecer treinamento, e muitas até têm um departamento inteiro dedicado ao tema com especialistas que se concentram em educação. Entretanto, o treinamento não é a única maneira de desenvolver Conhecimento.
Do ponto de vista da Gestão de Mudanças, existem dois tipos distintos de conhecimento. O primeiro é aquele sobre como mudar (o que fazer durante a transição), e o segundo é aquele sobre como executar efetivamente no dia a dia do estado futuro (habilidades e condutas finais necessárias). Para uma gestão efetiva, é importante considerar esses dois aspectos de forma separada.
Algumas formas de promover o Conhecimento são:
  • Treinamentos e certificações
  • Uso da experiência de colaboradores seniores
  • Orientação um-a-um
  • Capacitação de usuários-chave e subsequente difusão do conhecimento
  • Grupos de usuários e fóruns
  • Amplo acesso a informação
  • Mentoring

Obstáculos ao Conhecimento

Algumas das principais barreiras ao sucesso em se obter Conhecimento são:
  • Muita diferença entre o nível atual de capacitação e o desejado
  • Tempo insuficiente
  • Demandas de negócio conflitantes
  • Recursos inadequados para o treinamento
  • Falta de acesso às informações necessárias
  • Capacidade de aprender

Habilidade

A Habilidade é definida pela capacidade do indivíduo de demonstrar que os resultados gerais de desempenho esperados são alcançados ao se seguir as alterações propostas. Compreende um conjunto de fatores que vai desde a disponibilidade de ferramentas e processos bem definidos e alinhavados e a criação de uma estrutura de suporte (incluindo Help Desk e coaches) ao empoderamento do colaborador por parte da gestão executiva, garantindo que suas atividades e decisões tomadas já no estado futuro reflitam e tenham o efeito esperado de acordo com o que se planejou como mudança.

Diferenciando Conhecimento e Habilidade

Existe uma grande distinção, inclusive conceitual, entre Conhecimento e Habilidade. Embora alguém possa passar a dominar uma nova habilidade (as ferramentas necessárias, o processo, a técnica adequada), pode levar muito mais tempo para que isto se traduza em Habilidade em termos de desempenho. É importante garantir que, além do treinamento para construir Conhecimento, os colaboradores recebam ferramentas suficientes para desenvolver suas próprias habilidades. Isso inclui prática cotidiana, suporte de treinadores e disponibilidade para trabalhar em rede e com outras pessoas que passaram pela mudança com sucesso.
Ao se entender esta distinção, ajuda-se os funcionários não apenas a aprender novos comportamentos e Habilidades demandados pela mudança, mas também a garantir que eles possam colocar esse conhecimento em prática. Em última análise, isso permite que uma verdadeira mudança seja realizada individual e organizacionalmente.
Algumas formas de promover uma adoção frutífera de Habilidades são:
  • Envolvimento direto de treinadores
  • Acesso a especialistas no assunto
  • Monitoramento do desempenho
  • Prática "hands-on" durante o treinamento
  • Disponibilidade de recursos especializados para apoiar os colaboradores

Obstáculos à Habilidade

Algumas das principais barreiras ao sucesso em se obter Habilidade são:
  • Tempo disponível inadequado para desenvolver habilidades
  • Falta de suporte pós-implementação
  • Hábitos existentes contrários ao comportamento desejado
  • Bloqueios psicológicos
  • Limitações nas habilidades físicas
  • Capacidades individuais (limitações pessoais)

Reforço

A fase de Reforço cria os mecanismos para que a mudança promovida tenha continuidade. É uma ação para atacar a tendência natural a voltar à situação com que estamos acostumados; embora fazer uma mudança seja uma tarefa árdua, sustentá-la pode ser ainda mais difícil.
Uma das razões pelas quais o Reforço pode ser custoso, do ponto de vista da Gestão de Mudanças, é que, uma vez concluída uma mudança, já se está pensando nas próximas atividades e até em novas transformações. É preciso reconhecer a tendência ao retorno e a fugacidade do momento pós-implementação e construir instrumentos para fazer os efeitos da mudança perdurarem. De outra forma, corre-se o risco de se ter desperdiçado investimento no processo de mudança por não se conseguir efeitos desejados duradouros.
Algumas formas de promover o Reforço são:
  • Comemorações e "placares de conformidade" com as novas normas
  • Mitigação/eliminação das formas de contornar ou ignorar os novos processos
  • Medição de desempenho e feedback claros e objetivos
  • Recompensas financeiras, incluindo bônus por adaptação e desempenho
  • Reconhecimento individual visível para a companhia
  • Ações corretivas
  • Mecanismos de designação e verificação de responsabilidade

Obstáculos ao Reforço

Algumas das principais barreiras ao sucesso em se estabelecer o Reforço são:
  • Recompensas não significativas ou não associadas à conquista
  • Ausência de reforço e feedback para realizações
  • Consequências negativas, incluindo pressão dos colegas, pelo comportamento desejado
  • Incentivos que se opõem diretamente à mudança, demonstrando desalinhamento estratégico
Em suma, segundo [2], a base lógica para que as fases devam ser executadas em ordem, sem que se empreenda em uma antes da conclusão da anterior, está na "ordem natural em que as pessoas experimentam mudanças":
  • O Desejo não pode vir antes da Consciência, porque é a consciência da necessidade de mudança que estimula nosso desejo ou desencadeia nossa resistência a essa mudança.
  • O Conhecimento não pode vir antes do Desejo, porque não procuramos saber como fazer algo que não queremos.
  • A Habilidade não pode vir antes do Conhecimento, porque não podemos implementar o que não sabemos.
  • O Reforço não pode vir antes da Habilidade, porque só podemos reconhecer e apreciar o que foi alcançado.

Caso de Mudança: Implementação de ERP/CRM
O novo sistema de ERP/CRM foi lançado com sucesso. O projeto de implementação foi concluído apenas com um pouco de atraso e as expectativas da gestão executiva são altas. Seu objetivo e "razão de ser" é reduzir os custos de processos tanto de back-end, agilizar os processos de vendas e criar uma visão única de cliente, produtos e serviços para a companhia, suportando toda a cadeia de valor, compreendendo compras, planejamento de produção, estoques e marketing.
Durante uma reunião da alta diretoria, Carla, a VP de Marketing, tem algo a dizer sobre o novo sistema. Assim como os demais departamentos, sua área contribuiu em rateio para a implementação do sistema, e espera resultados de acordo. Sua equipe foi uma das melhor treinadas no CRM e, segundo a proposição de valor original, deveria ser capaz de planejar campanhas com uma visão muito mais precisa sobre o cliente do que a que anteriormente dispunham, baseada em dados factuais de vendas, comportamento em redes sociais e informações de Customer Service.
Porém, não era exatamente isso o que vinha ocorrendo. Carla e sua equipe não raro se deparavam com informações incompletas sobre o ciclo médio de vendas. Muitas vezes era melhor basear-se nos dados brutos, antes de terem sido inseridos na aplicação de Marketing do CRM, para elaboração dos relatórios em Excel, pois, ao cruzar informações de vendas e das campanhas pelo CRM, obtinha-se dashboards claramente inconsistentes. Ou seja, de forma muito parecida como sempre havia sido feito.
Jaime, VP de Manufatura, decidiu também colocar na mesa sua posição sobre sua vida pós-implementação. Seu processo de aquisição just-in-time estava sendo negativamente afetado por ordens de venda atrasadas, de forma que o ciclo produtivo estava sendo baseado em um Kanban feito "às cegas", com uma alta flutuação tanto no estoque de entrada de componentes básicos como no de produtos acabados. Como uma bola de neve, esta necessidade de entrar os dados de planejamento de produção manualmente para manter o chão de fábrica funcionando estava comprometendo a capacidade geral da empresa de realizar o seu planejamento operacional e orçamentário.
É interessante notar que em cada departamento houve problemas diferentes relacionados com deficiências em distintas fases do modelo ADKAR®:
  • em Vendas, a falha em estabelecer uma motivação para o Desejo da mudança fez com que os representantes de venda contornassem passos do processo, atrasando a entrada dos leads no ERP e/ou fornecendo informações incompletas;
  • no Marketing, os analistas não estão sendo capazes de fazer o seu trabalho de acordo com o que seria esperado no pós-implantação, sendo obrigados a voltar às praticas anteriores, num claro prejuízo em sua Habilidade de tirar o proveito esperado da mudança;
  • na Manufatura, um desalinhamento na definição do Reforço fez com que os funcionários do setor, para não terem seus indicadores de desempenho afetados e sofrerem penalidades, achassem maneiras de "manter a máquina funcionando", muitas vezes sem reportar aos seus supervisores diretos.

4. O gestor médio como comunicador e facilitador

Muito do sucesso de um projeto ou programa de mudança organizacional depende da média gerência da empresa. Afinal de contas, são eles os gestores mais próximos tanto do time de implementação do projeto como de seus usuários finais. Em tempos de mudança, aqueles que lideram as equipes impactadas podem ser tanto grandes aliados como obstáculos reais à adesão ao novo estado futuro e, por extensão, à realização plena dos resultados de negócio.
Estes gerentes e supervisores são, via de regra, responsáveis pelos aspectos mais palpáveis das carreiras dos colaboradores. Eles traçam seus planos de carreira, orientam suas tarefas, são o primeiro ponto de contato em caso de dúvidas e são os mais afetados pelo desempenho de seus subordinados. Envolvê-los no processo de Gestão de Mudanças desde o início e prepará-los para apoiar suas equipes é uma das atividades mais importantes para assegurar uma adoção de mudanças tranquila.
Segundo [4], existem importantes papéis a serem assumidos por gerentes e supervisores em um processo de mudança organizacional:
  • Comunicador: o supervisor de um colaborador é um canal essencial de informações sobre a organização, o trabalho realizado e alterações nesse trabalho resultantes de projetos e iniciativas. Ele é a melhor pessoa para endereçar perguntas como: "O que esta mudança significa para mim?", "Como posso e devo participar?" e "Por que estamos mudando?"
  • Advogado da mudança: o nível de adesão de um colaborador é muito dependente daquele de seu supervisor imediato. Se o gerente apenas superficialmente apoia a mudança, ou até se mostra resistente, pode-se esperar a mesma reação de seus subordinados. O gerente deve sentir-se confortável e ativamente participante para que a mensagem chegue sem ruído à sua equipe.
  • Guia para a mudança: o papel de guia para a mudança envolve apoiar sua equipe conforme as mudanças realmente comecem a afetar seu dia a dia. Devido a seu relacionamento, gerentes e supervisores podem orientar seus colaboradores individualmente através do processo e ajudá-los a endereçar os pontos impeditivos que se interpõem a uma mudança bem sucedida.
  • Ponto de contato com o projeto: os supervisores criam uma ponte entre a sua equipe e o time do projeto de mudança, providenciando informação entre o projeto e seus reportes imediatos. Eles estão na melhor posição para fornecer ao projeto informações sobre design, usabilidade e aspectos específicos da solução sob o ponto de vista de seus colaboradores, assim como pontos sobre funcionalidade e preocupações durante a fase de implementação.
  • Gestor da resistência: a média gerência está na proximidade exata de seus subordinados para identificar focos de resistência, como ela se manifesta e suas causas. Com o devido preparo e ferramental, são os mentores mais adequados para gerenciar ativamente a resistência quando e onde ela ocorrer.
Caso de Mudança: Implementação de ERP/CRM
Antes de declarar a implementação do sistema um fracasso, os diretores decidem criar uma força-tarefa para endereçar os pontos identificados com o auxílio de um profissional de Gestão de Mudanças. Eles sabem que o tempo para terem feito esse exercício de maneira eficaz e menos onerosa deveria ter sido durante o projeto*, mas é evidente que não se deseja perder o investimento realizado
É montada uma iniciativa junto aos gerentes de cada uma das áreas envolvidas para identificar junto aos colaboradores o que os está impedindo de cumprir as determinações criadas pela mudança, qual o seu nível de conforto atual, e o que poderia ser feito para solucionar a situação.
Com estas informações em mãos, a força-tarefa instituiu o seguinte plano de ação:
  • plano de comunicação com difusão de e-mails, campanha interna de marketing, webinars e gamificação
  • criação de documentação clara, objetiva e facilmente acessível via intranet sobre as novas normas de operação da companhia com a adoção do novo sistema
  • revisão dos planos de incentivo profissional e compensação, adequados a cada uma das áreas. Serão aplicados bônus às práticas em conformidade com as normas e penalidades em caso contrário
  • capacitação e empoderamento específicos para os gerentes médios e supervisores para a condução da mudança em uma situação pós-implementação
  • reuniões mensais entre supervisores e funcionários para avaliação da adoção e melhoria contínua de conformidade
Finalmente, foi também criada uma prática de captura e curadoria das informações durante esta fase tardia de Gestão das Mudanças, para que estas dificuldades e impeditivos sejam mitigados em um próximo processo de transformação.
*: recapitulando uma conhecida pesquisa na área de desenvolvimento de software [6], mas que se aplica neste caso, custos de correção de erros em fase de Operação podem ser até 60 vezes maiores do que tivessem sido detectados e eliminados em fase de Design, e até 180 vezes maiores do que na fase de Análise de Requisitos!
Dado o valor da gerência média para o sucesso na adoção da mudança, o treinamento e empoderamento destes stakeholders são essenciais, devendo-se envolvê-los no processo desde o começo do projeto. O Gestor de Mudanças deve criar nestes supervisores a consciência de sua importância e necessidade neste processo, assim como prover as ferramentas e habilidades exigidas para o melhor desempenho próprio e de sua equipe.

Conclusão

Neste segundo artigo, focamos em detalhar em algumas diferenças entre culturas e estilos empresariais, expor a necessidade de uma abordagem metodológica, aprofundar o entendimento sobre como os colaboradores, como partes constituintes da organização, são essenciais para o atingimento dos objetivos de negócio com o estado futuro planejado, discutir sobre a importância de um tratamento com atividades definidas e encadeadas e o papel da média gerência de uma empresa em um projeto de transformação empresarial.
No último artigo da série, tratarei da aplicação específica da prática em projetos de Transformação Digital, o que torna este tipo de engajamento especial, e como atuar para se obter o máximo das iniciativas de inovação de produtos e modelos de negócio.

Sobre o Autor


Alessandro F. Martins é Estrategista de TI para Negócios Sênior com 21 anos de experiência em áreas abrangendo de Arquitetura Empresarial e Gestão de Processos de Negócio a Gestão de Programas e Projetos, consultoria para nível executivo de grandes empresas e aconselhamento para Inovação Digital.

Referências

[1]: Jeffrey M. Hiatt, Timoty J. Creasey: Change Management: The People Side of Change, ISBN 978-1-930885615
[2]: Jeffrey M. Hiatt: ADKAR: A Model for Change in Business, Government and our Community, ISBN 978-1-930885509
[3]: The Prosci ADKAR Model Series on Prosci Website:
[4]: Prosci Thought Leadership Articles: Manager/Supervisor's Role In Change Management: https://www.prosci.com/resources/articles/manager-change-management-role
[5]: Prosci Research Process: https://www.prosci.com/about/research-process
[6]: Jonette Stecklein, Jim Dabney, Brandon Dick, Bill Haskins, Randy Lovell, Gregory Moroney: Error Cost Escalation Through the Project Life Cycle: https://ntrs.nasa.gov/search.jsp?R=20100036670

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